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segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

versus

     Eu direi que o meu sofrimento não interessa porque há gente a morrer à fome, tu dirás que não é possível medi-los, um e outro, equacioná-los numa mesma balança, eu perguntar-te-ei porquê, tu responderás que os problemas são relativizados perante um determinado contexto, que a fome inviabiliza todo e qualquer manifesto humano que não seja de completa entrega altruísta no sentido da sua destruição e erradicação, mas eu argumentarei que os meus problemas não são menores do que esses porque são meus, tu contra-atacarás que eu sou um fedelho burguês habituado ao conforto e à demasia, aí eu não terei argumentos suficientemente sólidos, mas nunca entenderei realmente o porquê de tantos revolucionários preocupados com o estado da Terra exercerem violência sobre os seus esposos e esposas ou serem pais ausentes ou filhos mal agradecidos, tu responderás que isso é em prol do bem comum e eu dir-te-ei que quero que o bem comum se foda porque nem Jesus nem Aristóteles nem o Che Guevara nem o John Lennon conseguiram mudar o mundo, o meu sofrimento não é equiparável ao sofrimento da fome e doença, mas pelo menos partilho a minha comida com todos aqueles que conheço, esta minha ação devia ser um efeito borboleta, se todos repetissem o gesto não haveria mal no mundo, e mais direi que talvez o mundo seja os cordões que mataram a Sarah Kane mas que ainda assim mereça salvação, acrescentarei peremptoriamente que o mundo devia ser a construção através do amor e que a única coisa perene e que nunca morre no mundo é o dinheiro, mas no fundo hei-de desabafar que não acredito na sua redenção e expurgação porque o instinto básico humano é a sobrevivência e não o altruísmo social.   

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