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segunda-feira, 23 de maio de 2011

"cerra-se o frio"

Leva-me a ver Diógenes. Maria Helena disse estas palavras sem a certeza de as sentir ou sequer de que o que elas significavam fosse possível. Baltazar Alexandre, que mexia a sopa ao lume, parou por momentos, a sua face iluminada pelo fogo. Era como se soubesse que aquele pedido era inevitável, e não sabia se o temia ou por que razão o temia, como se acedendo à súplica de Maria Helena um qualquer mecanismo já em andamento iniciasse um movimento perpétuo cujo resultado seria nefasto. Sem se voltar para a mulher, disse somente, Primeiro, comeremos. E voltou a mexer a sopa agora apenas por mexer.
O ágape foi o silêncio do tempo. Comeram os dois, homem e mulher, cada um pensando coisas diferentes ou porventura equivalentes, não se atreveriam a revelá-las. Terminaram, Maria Helena entregou o seu prato a Baltazar Alexandre, que lavou a loiça numa velha pia barulhenta. É tarde já, disse o velho homem. É melhor que agora durmamos e amanhã pensemos nos passos a dar em seguida. Maria Helena não pareceu satisfeita com as suas palavras, sentia-se cansada, sim, mas saberia que nenhum descanso seria possível. Perguntou, no entanto, Onde durmo. Dormirás na minha cama e eu na sala, e por favor não insistas em dizer que não porque não poderia ser de outra forma, estando tu grávida e nós em minha casa. Maria Helena reconheceu nesse instante o mesmo Baltazar Alexandre que conhecera e, por momentos, a sua vista que só via noite conseguiu vislumbrar um rasgo de luz límpida. 

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